sexta-feira, 7 de setembro de 2007

O DISCO QUEBRADO AINDA ESTÁ COMIGO

Me criei com ouvidos voltados para o rádio. Era meu canal de ligação com o mundo, uma espécie de "internet da época", pois varava madrugadas escutando emissoras de ondas curtas e imaginando como seriam os lugares de onde vinham os sons: Londres, Paris, São Paulo, Buenos Aires, Moscou, Tóquio, Montevideu, Rio de Janeiro, Montreal, Pequim, etc. Eu viajava e começava a fomentar o espírito aventureiro que me acompanharia pela vida inteira. No AM, escutei - entre outras - a Nacional, a Roquete Pinto e a Tupi (todas do Rio); a Record, a Bandeirantes, a Panamericana e Eldorado (de São Paulo); a El Mundo de Buenos Aires e a El Espectador de Montevideu. Ouvi a Farroupilha quando ela transmitia onde hoje está a Rádio Gaúcha, e esta quando ficava ao lado da Guaíba (que era minha preferida) onde hoje está a Farroupilha. Escutei a primeira transmissão da Copa do Mundo, em 1958. Ouvi os discursos de Brizola aos domingos à noite na Farroupilha e toda a campanha da Legalidade que ele comandou pela Guaíba. E também o Flávio Alcaraz Gomes contando a guerra do Vietnã e os lançamentos de foguetes (se dizia assim naquela época) de Cabo Canaveral, na Flórida. E também gostava de escutar o Teixeirinha e a Mary Terezinha na Farroupilha e depois na Gaúcha ao entardecer e no início da manhã (esses mais recen tes). Grande parte dos meus gostos musicais tiveram influência da Guaíba, da El Mundo e da Rádio JB (do Rio de Janeiro, hoje não existe mais, é só em FM). O rádio, é fácil perceber, foi muito influente na minha formação. E claro, nesta história tem a Rádio Rio Pardo. No início de década 60 comecei a me aproximar dela. Tímido, receoso de revelar minha verdadeira intenção que era de um dia ser um locutor famoso, tipo Heron Domingues, Pedro Luiz, Lauro Hagemann, Valdir Amaral, Fiori Giglioti e tantos outros. Acomopanhei programas de auditório, fui fazendo amizade com os locutores e logo estava junto ao estúdio assistindo as transmissões e até ajudando em alguma tarefa. A Rádio estava instalada no Edifício Lima Silveira, na Andrade Neves. Dessa época lembro do Fiapo, Mazotti, Abel Borba, Almir Ribeiro, Osmar Gomes Pereira, Fernando Stähler (por um tempo chegamos a planejar fundar uma outra rádio...) e o Adão Maciel - deixei por último. Claro que exitem outros, e também muitas histórias para um dia serem contadas, mas quero relatar um fato com o Adão Maciel. Sério, triste, angustiado, o Adão era uma figura especial. Conheci-o já homem maduro, envolvido pela bebida e diziam, pelas desilusões de quando era jovem . Era um bom locutor, de voz grave, pausada e com uma forma marcante de destacar a pontuação e vírgulas nos textos que lia. Num domingo eu estava na Rádio acompanhando o Adão na locução de um programa musical. O Fiapo estava por lá e preparava textos para uma transmissão esportiva que faria à tarde. O Adão adorava músicas mexicanas e paraguaias. Havia selecionado uma ou duas guarânias para aquela transmissão e, depois de ter reproduzido as faixas do disco, foi guardá-lo numa patreleira ao lado da mesa de som. Mas acabou batendo com o cotovelo no disco que quebrou parcialmente . O Fiapo pegou e foi jogá-lo fora, num lixo feito de madeira, que por muitos anos esteve ao lado da mesa de som. Eu não tive dúvidas e pedi que, como iria para o lixo, me dessem de presente. O Adão ainda me advertiu: "as faixas já estão com chiado"... Fui para casa exultante. Era um troféu. Foi um dos primeiros discos de uma grande discoteca que por muitos anos fui aumentando e acrescentando, até chegar a época dos CDs. Mas ainda ouço hoje o "Gurânias Eternas" com "Dionisio, sua Harpa e seu Conjunto Paraguaio" (foto abaixo, eu com o disco). As duas primeiras faixas, da cada lado, estão inutilizadas pelo acidente. Ainda dá para ouvir canções magníficas. O Adão e o Fiapo já partiram para a outra vida, já fazem muitos anos. O disco ainda está aí ... e eu não consegui ser locutor. Outro dia, relatarei a segunda parte dessa história minha com o rádio, que teve prosseguimento até fora de Rio Pardo mas não se concretizou. E... eu terminei sendo jornalista.

Um comentário:

Anônimo disse...

Ola Rogerio!Li seu comentario no JR e axei simplismente lindo...emocionante...e principalmente de uma pureza de sentimentos incriveis....eu tbm sou fã de Log Players apesar de minha pouca idade(apenas 25 aninhus)...o detalhe eh q fui criada ouvindo esses bolachoes com meu pai...Outro dia ateh ele teve aki e me trouxe alguns e disse q seria a unica herança q ele tem para me deixar...e eh apenas esta q quero mesmo respondi...tenhu verdadeira fascinação por estas raridades tanto q aprendi a trabalhar com elas...sim trabalhar mesmo...fiz uma adequação no meu pc de onde consigo transferir as musicas para um CD, mas sem perder os "chiados"- a naum ser q o cliente peça claro-eu particularmente adoro aquele som de "moita queimando ao fundo..."...bem estou aki para te agradecer pelo artigo taum bem escrito e tbm para divulgar meu trabalhinho...se souberes de alguem q tenha interesse em fazer esta transferencia para poder voltar a escutar suas musicas jah q os aparelhos para este fim, estaum chegando ao fim..kkkk...me de um alo pelo email ou ateh mesmo pelo celular o meu numero eh 96223881...grata e certa de que vou ler ainda muito artigos lindos escritos por vcs...deixo-lhe os meus mais sinceros parabens...abraços..Patricia Paranhos